Sal
Então vieste sem que eu entendesse,
e explicaste o que sou. Não fossem os fatos, não fosse o clima outonal, as
flores e os frutos cítricos da estação, estaríamos felizmente ilhados em nosso
descabimento amoroso. Não fossem os outros, não fosse minha própria
incapacidade de ferir o trópico de câncer com o traço do equador, se não fossem
minhas longitudes, teríamos um lugar na esperança de sermos o que desejávamos
ser.
Agora assombram dúvidas que
outrora sequer pareciam capazes de uma existência real, puseste uma pitada de
sal e ardor na minha língua para que eu provasse prazer com amor e sentisse a ânsia
de viver uma vontade pura e própria. Salve-me a terapia já que desde sempre
tenho criado problemas por mim mesmo. Não preciso de aliados, já que não
bastariam sugestões insolúveis quando teus olhos avançam os meus por através de
minhas lentes sujas e de meus argumentos inválidos.
Retornaste do teu exílio enquanto
perdia minha identidade e razões de ser. Tuas garrafas de vinho e os cigarros
sem a tragada mortal fizeram teu conforto incompleto e reconstruíram tuas
hipóteses apressadas de vida futura. O tempo e as escolhas que tínhamos - não
fossem os astros, os presságios, os sinais -, sequer existiriam. Não fosse o
livro, a empatia e o fulgor, eu sequer entenderia a perda possível e a
felicidade provável de um amor verdadeiro.
Que delícia de ler!
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